domingo, 7 de maio de 2023

 

O PAPEL DOS QUADRINHOS NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL




A Segunda Guerra Mundial foi o maior conflito bélico da história da humanidade, envolvendo praticamente todas as nações do globo. De uma lado estavam os países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão), do outro os Aliados (Inglaterra, Estados Unidos e União Soviética). O conflito se encerrou em 1945, com a invasão de Berlim pelo Exército Vermelho e a destruição de Hiroshima e Nagasaki com o lançamento de duas bombas atômicas (Little Man e Fat Boy).

O conflito, iniciado no final da década de 1930, só caminhou para o seu término com a entrada dos Estados Unidos, em 1941, após ser surpreendido por um ataque do Japão à base naval de Pearl Harbor. Esse evento mudou a divisão das forças e fez com que a opinião pública norte-americana se engajasse a favor de sua participação na guerra. A cultura de massa, representada pelo cinema e pelos quadrinhos, teve papel fundamental nesse engajamento.

Segundo McCloud (1995), quadrinhos são imagens pictóricas colocadas deliberadamente em sequência com objetivo de transmitir alguma informação ou produzir alguma narrativa para quem os lê. Voltados principalmente para o público infantil, as HQs (Histórias em Quadrinhos), ou simplesmente Quadrinhos, são hoje um veículo consumido por homens e mulheres de várias faixas etárias e classes sociais, em vários formatos, mostrando o alcance dessa modalidade de literatura.

Imaginar as HQs como uma forma de literatura inferior é, no mínimo, incorreto. Devemos pensá-las não só como arte, mas também como fonte histórica. Tal expressão artística funcionou como meio bastante eficaz de propaganda ideológica antes, durante e depois da Segunda Guerra Mundial, não somente nos Estados Unidos, mas também em seu oponente, o Japão. Cada um com suas peculiaridades.

As HQs fazem parte da produção cultural de cada país e, dessa forma, serve como instrumento de análise da sociedade que as produziu, mostrando-nos sua vida cotidiana, seus costumes, sentimentos e ideologias presentes em sua época. Um acontecimento marcante, como a Segunda Guerra Mundial, que deixou cicatrizes visíveis até hoje, encontra nas HQs um veículo de grande simbolismo para que possamos compreender a mentalidade vigente naqueles dias e, dessa forma, fazermos com que seus acontecimentos não sejam esquecidos (não é esse o objetivo da História?).

Durante a Segunda Guerra Mundial, as HQs, assim como o cinema, concorreram para mobilizar a opinião pública a apoiar o governo, tanto ideologicamente, como financeiramente, contra a ameaça nazista, personificada na figura de Adolf Hitler. As HQs buscavam unir os leitores, inspirando-os a se alistar e, dessa forma participar diretamente do conflito, ou a adquirir os bônus de guerra – títulos da dívida pública – que serviam para financiar os gastos do governo no conflito.

Mas não era apena a opinião pública que servia como alvo das HQs durante a Segunda Guerra Mundial. Os próprios soldados no front recebiam HQs de super-heróis com o objetivo de se inspirarem nas figuras desses seres míticos durante as batalhas. E tanto do lado norte-americano quanto do lado japonês as HQs tiveram papel relevante de propaganda ideológica.

Ainda antes do ingresso dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial, em 1938, dois artistas judeus, Jerry Siegel e Joe Shuster criaram o Super-Homem, e em 1941, Joe Simon e Jack Kirby criaram aquele que seria o maior símbolo de resistência da democracia norte-americana contra a tirania, o Capitão América. Esses dois super-heróis se mostraram bastante eficientes quanto aos objetivos anteriormente citados.

Tanto o Super-Homem como o Capitão América representavam os ideais patrióticos norte-americanos tanto por meio de suas ações como por meio do simbolismo de seus uniformes, cópias veladas da bandeira dos Estados Unidos. Esse subterfúgio foi utilizado também na criação da super-heroína Mulher Maravilha. Essa iconografia representava uma tentativa de incentivo ao patriotismo do público leitor, que ao consumir tais HQs se identificavam com as ideias mostradas nas aventuras, podendo apoiar as tropas da melhor maneira possível, adquirindo mais bônus de guerra, ou mesmo se alistando.

Inicialmente, o inimigo a ser derrotado não foi a Alemanha, mas o Japão. Obviamente, a opinião pública estava ensandecida com o ataque surpresa dos japoneses sobre Pearl Harbor, e havia a necessidade de uma contraofensiva, tanto nos campos de batalha como no imaginário popular. Com isso, os japoneses passaram a ser retratados cada vez mais com feições inumanas, monstruosas. A edição 58 de Super-Homem, de março de 1943, trazia em sua capa a chamada “Superman says: you can slap a jap” (Super-homem diz: você pode esbofetear um japa), mostrando o grau de xenofobia que a população oriental – não só japoneses, mas também chineses – foi submetida em território norte-americano. Prova disso é a instituição da Ordem de Exclusão Civil, assinada em 1942, que propunha que todos os cidadãos de ascendência japonesa na costa do Pacífico deveriam se reportar a centros militares. A edição 23 de Capitão América, lançada em março de 1943, trazia o super-herói dando um soco em um militar japonês enquanto proferia a frase “You started it! Now we’ll finished it!” (Vocês começaram! Agora nós vamos acabar com isso!). Dessa forma, os japoneses se tornaram os inimigos número um a serem combatidos nas HQs, deixando para trás os nazistas alemães e os fascistas italianos.

Do outro lado do globo, no Japão, as publicações estavam totalmente voltadas para a propaganda militar, em uma clara tentativa de angariar apoio da população ao conflito. Os norte-americanos eram retratados como demônios a serem combatidos. Obras que retratavam robôs destruindo cidades norte-americanas também foram publicadas. Além desse tipo de narrativa, histórias que mostravam a importância do trabalho nas fábricas com o intuito de ajudar o país foram incentivadas. Artistas que se negavam a se alinhar ao governo japonês eram presos, acusados de serem antipatriotas. Os artistas que se alinhavam ao governo tinham que produzir obras que ajudassem a levantar o otimismo da população japonesa, obras que retratassem o inimigo como vilões a serem combatidos, ou obras em inglês para serem jogadas contra as linhas inimigas. Essas últimas buscavam desmoralizar os soldados norte-americanos e ingleses, contando histórias de esposas que traíam seus maridos, enquanto eles estavam na frente de batalha.

Com as explosões das bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki, e a posterior rendição do Japão, a produção de mangás foi interrompida pela falta de matéria prima e pela censura imposta pelos Estados Unidos. Anos depois, surgiram HQs de temática antibélica. Uma das principais obras foi o mangá Gen pés descalços, escrito por Keiji Nazakawa, sobrevivente de Hiroshima, testemunha ocular da atrocidade cometida pelo uso de armas nucleares, que conta como sua família foi dizimada.

 

Referências:

MCCLOUD, Scott. Desvendando os Quadrinhos. São Paulo: Makron Books, 1995.

NEUMANN, Clare Laurelin Nunes. Propaganda Ideológica Em Quadrinhos Na II Guerra Mundial: Uma Análise Pela Hermenêutica De Profundidade. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Relações Públicas. Goiânia: UFG, 2018.

SUCHMACHER, Renan. A representação da Segunda Guerra Mundial em alguns quadrinhos japoneses de guerra e sua importância para o meio. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Comunicação Social. Rio de Janeiro: UFRJ, 2015.

Quer fazer um curso completo de História? O curso História para ENEM e Concursos tem mais de 100 aulas, totalizando quase 20 horas de vídeos, e cabe perfeitamente no seu orçamento.

Acesse 

www.udemy.com/course/historia-da-idade-moderna/?referralCode=D634A052D4A4DB3033CB