sábado, 30 de setembro de 2023

 XIITAS E SUNITAS



As palavras têm o poder de, com o tempo, adquirirem novos significados. Quando ouvimos a palavra xiita, por exemplo, nos vem à mente a figura de pessoas extremistas e violentas. Mas você sabe o que originalmente significa xiita? As palavras xiita e sunita advém do islamismo, religião surgida na península arábica na segunda metade do século VII. O islamismo é uma religião monoteísta que prega a submissão aos preceitos de Alá.

Fundada por Maomé, o islamismo alterou a configuração religiosa do Oriente Médio, África e até Europa. Segundo a tradição, Maomé teria recebido revelações de Deus, em 610 tendo sido escolhido para ser o último profeta enviado à humanidade.

Após a tomada de Meca pelos seguidores de Maomé, em 630, o islamismo foi se espalhando pela península arábica, unificando os diversos povos, e dando a eles não só uma unidade religiosa, mas sobretudo uma unidade política, centralizada na figura de Maomé, que foi o líder político-religioso até sua morte, em 632. Após a morte de principal líder da nova religião, dois grupos passaram a lutar pelo direito de sucessão: os xiitas, que defendiam que apenas alguém ligado por laços familiares poderia suceder a Maomé; e os sunitas, que defendiam o direito de sucessão por eleição pelos membros do Islã.

No primeiro momento, a corrente xiita venceu. O sucessor de Maomé foi um membro de sua família. Seguiram-se outros três sucessores pertencentes ao círculo familiar do profeta até o ano de 661, quando os sunitas da família Omíada tomaram a liderança do islamismo, expandindo seu poder pela península ibérica.

O islamismo não se espalhou por toda Europa ocidental porque foi barrado em 732, por Carlos Martel, avô de Carlos Magno, na Batalha de Poitiers. Os xiitas, aqueles que defendiam a liderança do islamismo por alguém ligado à linhagem de Maomé, tentaram, por várias vezes, retomar o califado, mas foram subjugados pelos sunitas.

Após inúmeros desentendimentos, os dois grupos se confrontaram na Batalha de Karbala, em 680. Nessa batalha, membros da linhagem de Maomé foram mortos, o que causou o rompimento completo entre sunitas e xiitas. As diferenças entre xiitas e sunitas se agravaram com o passar do tempo. Longe do poder, os xiitas passaram agora a discordar sobre a escolha de seu imã, líder religioso, o que causou novas rupturas internas. Os xiitas se dividiram em várias correntes, sendo as mais importantes os duodécimos, os ismaelitas e os zayditas.

No mundo atual, são de tendência xiita os governos do Líbano, Síria, Iraque e Irã. O Irã, inclusive, merece um capitulo de destaque na ascensão xiita, pois a Revolução Iraniana, de 1979 fez o país sair da área de influência dos Estados Unidos para se tornar um grande antagonista da política e da cultura norte-americana, nomeando seu antigo aliado de “O Grande Satã”.

Apesar de os xiitas dominarem politicamente alguns países, os sunitas são a maioria entre os muçulmanos — mais de 80 por cento de toda a população islâmica pertencem a essa corrente. Os sunitas se consideram o ramo mais tradicional e ortodoxo do Islã.

Após o ataque às Torres Gêmeas, em 2001, o mundo passou a associar o terrorismo aos muçulmanos, especialmente aos xiitas, considerados extremistas e fundamentalistas religiosos, o que agravou ainda mais o antagonismo já existente entre o islamismo e a cultura ocidental, principalmente norte-americana.

 

Referências:

POLAZZO, Carmem Lícia. As múltiplas faces do Islã. Saeculum – Revista de História, n. 30, João Pessoa, jun. 2014.

LÊUS, Lucas Rezende et al. O Corredor Xiita no Oriente Médio e seus reflexos para a segurança internacional.

ASSISTA NO YOUTUBE: https://youtu.be/5MRtqDt05RI  

 

sábado, 23 de setembro de 2023

 OS 300 DE ESPARTA E SUA APROPRIAÇÃO PELA CULTURA POP



Por volta do século VI e V a.C., os persas começaram a ameaçar a Grécia continental, justamente quando a civilização persa vivia um processo de ampliação territorial graças à ação militar de vários de seus reis. Inicialmente, a relação entre gregos e persas foi marcada por uma relativa estabilidade. Contudo, a adoção de uma política de exploração deu início a uma série de conflitos. O confronto entre persas e gregos ocorreu no que se chamou Guerras Médicas, assim chamado por que os persas eram conhecidos como medos.

 

Entre 500 e 494 a.C., algumas cidades jônias, com o apoio militar dos gregos, resolveram se rebelar contra as imposições persas. Logo em seguida, Dario I, em represália, decidiu organizar tropas que invadiram a Grécia Continental. A primeira tentativa dos persas, ocorreu em 492 a.C., e foi frustrada por um forte temporal que atingiu parte dos navios persas. No entanto, em 490 a.C., os persas organizaram uma nova tentativa de invasão, mas acabaram sendo derrotados na chamada Batalha de Maratona.

 

Em 480, Xerxes, filho de Dario, mobilizou um enorme exército contra os gregos. Nessa nova invasão, o primeiro confronto entre persas e gregos ocorreu no desfiladeiro de Termópilas, onde um grupo de apenas 300 soldados espartanos, liderados pelo rei Leônidas, resistiu contra o poderoso exército persa. A Batalha de Termópilas durou três dias e ocorreu em agosto ou setembro de 480 a.C. O exército persa, que, segundo estimativas modernas seria composto por 300 000 homens, chegou à referida passagem no final de agosto ou início de setembro. Em um número bem inferior, os gregos detiveram o avanço persa durante sete dias no total (incluindo três de batalha). Durante dois dias repletos de embates, uma pequena força liderada por Leônidas bloqueou a única passagem que o imenso exército persa poderia usar para entrar na Grécia.

 

Escritores antigos e modernos têm utilizado a Batalha das Termópilas como um exemplo do poder que um exército patriótico pode exercer defendendo seu próprio solo com um pequeno grupo de combatentes. O comportamento dos defensores na batalha também é usado como um exemplo nas vantagens do treinamento, do equipamento e bom uso da terra como multiplicadores de força de um exército, tornando-se um símbolo de coragem contra as adversidades.

 

Essa batalha também acabou se tornando também objeto de apropriação da cultura pop, sendo vendida como filme e história em quadrinhos. No final da década de 1990, Frank Miller e Lynn Varley lançaram a graphic novel 300. Frank Miller foi um quadrinista muito influente na década de 1980, desenhando heróis da Marvel, e 300 obteve um enorme sucesso. Tanto que em 2007, o cineasta Zack Snider, diretor conhecido por seus filmes de super-heróis, como Watchmen (2009), Homem de Aço (2013), Batman vs Superman (2016) e Liga da Justiça (2021), resolveu adaptar os quadrinhos para a tela. E tanto a HQ quanto o filme são releituras fictícias da Batalha de Termópilas durante as Guerras Médicas. O próprio Frank Miller serviu como produtor executivo e consultor do filme.

 

O enredo do filme gira em torno do Rei Leônidas (Gerard Butler), que lidera 300 espartanos na batalha contra o "deus-rei" Xerxes I (Rodrigo Santoro) da Pérsia e o seu exército invasor com mais de 30 mil soldados. Os eventos são revelados como uma história contada por Dilos, o único dos 300 espartanos a sobreviver à batalha.

terça-feira, 12 de setembro de 2023

 

O MONOTEÍSMO NO EGITO ANTIGO

 


Apesar de sua natureza proeminentemente politeísta, o Egito antigo passou por um curto período dedicado ao monoteísmo.  No Novo Império, precisamente durante o governo de Amenhotep III, devido a disputas entre o faraó e os sacerdotes de Amon, cresceu a importância dada ao deus Aton, o disco solar.

Por volta de 1400 a.C., Amenhotep III realizadou algumas transformações religiosas em seu governo, dando maior espaço para Aton, uma divindade que já existia no panteão dos deuses egípcios, mas como um deus de segunda categoria. Com a morte de Amenhotep III, seu filho Amenhotep IV assume e leva adiante as transformações religiosas iniciadas por seu pai. Sua reforma religiosa é considerada o episódio religioso-político mais controverso da história do Egito antigo.

Amenhotep IV superou seu pai, elevando Aton a deus único, em detrimento das outras divindades egípcias, tornando-o o deus supremo e obrigando todo o Egito antigo a se tornar monoteísta. Amenhotep IV ampliou a importância de Aton a tal ponto que Amon teve sua hegemonia reduzida até ser totalmente omitido das doutrinas.

Aton, diferentemente das demais divindades egípcias, não tinha uma representação antropozoomórfica, sendo representado por um sol cujos raios terminavam em pequenas mãos. De fato, isso também constituía uma intensa alteração no que diz respeito às formas figurativas pelas quais as divindades eram retratadas no Egito antigo.

O “Hino a Aton” exprime a grandiosidade pela qual se buscava impor àquela sociedade: “És gracioso, grande, resplandecente e estás muito acima de todas as terras. [...] O mundo surgiu pela tua mão [...]”. De qualquer forma, Amenhotep IV promoveu um monoteísmo agressivo, diminuindo a distância entre a divindade e a família real, tornando-se quase semelhante ao seu próprio deus.

Amenhotep IV mudou a capital de seu reino de Tebas para a nova Akhetaton (“Horizonte de Aton”), que seria a cidade sagrada de Aton. Antes de mudar a capital, Amenhotep ("Amon está satisfeito") IV mudou seu próprio nome para Akhenaton ("o espírito atuante de Aton"), reforçando a negação a Amon por parte do rei e sua ênfase em Aton.

Entretanto, apesar de toda sua determinação em implantar o monoteísmo no Egito antigo, o povo reagiu de maneira negativa a essa nova forma de religião. Os egípcios antigos estavam acostumados aos contrastes entre a luz e a escuridão, bem como à luta entre o bem e o mal. A doutrina de Akhenaton negava a dualidade, e enfatizava o aspecto positivo, a luz. O mundo inferior, com seus demônios, não tinha lugar nos conceitos da nova religião.

E aparentemente, mesmo aqueles que seguiam Akhenaton não seguiam seus ensinamentos completamente. Escavações indicam que as pessoas, ao menos em particular, mantinham suas crenças tradicionais. Elas certamente sentiram a perda de seus deuses e de suas doutrinas, o que corroborou para o retorno das antigas práticas politeístas assim que Akhenaton deixou de existir.

 

Referências:

SALES, José das Candeias. As divindades egípcias. Uma chave para
a compreensão do Egito Antigo.
Lisboa: Estampa, 1999.

SILVERVAN, David. O divino e as divindades na antigo Egito. In: SHAFER, Byron (Org.). As religiões no Egito antigo: deuses, mitos e rituais domésticos. São Paulo: Nova Alexandria, 2002.