A BATALHA DE AGINCOURT E O TRIUNFO DE HENRIQUE V
Monteiro,
Martins e Agostinho (2015) fazem uma empolgante revisão literária sobre a
Batalha de Agincourt de 1415. Como não poderia deixar de ser, os autores chamam
a atenção para a obra de Shakespeare, Henrique
V, que imortalizou o monarca inglês responsável por essa importante vitória
das forças inglesas sobre os franceses no início do século XV. Para os autores,
tanto ingleses quanto franceses tentaram escrever a história ocorrida em
Agincourt de acordo com suas convicções, nas quais podemos encontrar
similaridades, bem como discrepâncias.
Entre
as fontes de época, os autores chamam a atenção para a Gesta Henrici Quinti, datada por cerca de 1417, de autoria de um
dos clérigos da campanha inglesa. Da mesma forma, destacam La Chronique d’ Enguerran de Monstrelet, de Jean Waurin e de Le Fèvre,
a partir de relatos do capitão do conde de Saint-Paul. Esses relatos são donos
de grande importância para o entendimento da Batalha de Agincourt por terem
servido como testemunhas oculares do embate entre franceses e ingleses.
Enquanto a querela entre França e
Inglaterra se estendia desde o século XI, a situação política de ambos os
reinos, no início do século XV, era bastante turbulenta. O regente francês, Carlos
VI, envolvido com sérios problemas de saúde, tinha o seu trono cobiçado por
membros da realeza francesa, enquanto na Inglaterra, Henrique V tinha por
obrigação apagar a pecha de usurpador, agregando o apoio da nobreza. A melhor
forma de resolver os problemas? Declarar guerra, lógico.
No dia 24 de julho de 1415, Henrique
V redigiu seu testamento, ofereceu esmolas, encomendou missas e pediu ajuda a
Deus para dizimar os franceses e ser aclamado por seu povo. Em 11 de agosto
daquele ano, a armada inglesa levantou âncora de Southampton e partiu para Harfleur,
cidade francesa que tinha seu lado sul voltado para o rio Sena. Henrique V
calculava tomar Harfleur rapidamente. Entretanto, a cidade só capitulou no dia
23 de setembro, o que provocou o consumo maior do que o previsto de mantimentos
trazidos pela armada inglesa. Além disso, uma terrível epidemia de disenteria havia
aniquilado um considerável número de combatentes ingleses. Ou seja, a fome, as
batalhas e a disenteria eram obstáculos que haviam surgido contra o plano do
dirigente inglês.
Henrique V e seus homens partiram de
Harfleur no dia 9 de outubro e só se depararam com as forças francesas no dia 24
daquele mês, véspera do dia de São Crispim, santo francês, nas proximidades de
Agincourt. O exército inglês contava, estima-se, com 9 000 homens. Estavam
cansados de lutar para tomar Harfleur, bem como pela caminhada de 400 km que
haviam realizado entre Harfleur e Agincourt. Além da fome e da disenteria. O
exército francês tinha, segundo relatos, no mínimo, 12 000 homens, fortemente
armados de infantaria e cavalaria.
Quando o dia de São Crispim raiou os
dois exércitos se colocaram em posição de combate, mas não sem antes realizarem
missas para serem abençoados pela suprema bondade de Deus, ou para encomendarem
as almas de seus adversários ou as suas próprias. Era claro, naquele momento,
para ambos os lados, que a superioridade numérica do exército francês servia
como premonição do que se desenharia no campo de batalha.
Entretanto, nesses momentos em que a
História se transmuta em algo mítico, não aconteceu como previsto. Os arqueiros
ingleses, escondidos nos bosques, forçaram a cavalaria francesa a voltar, indo de
encontro aos arqueiros que vinham em seguida, anulando o poder ofensivo desses
últimos. Esclareçamos que o campo de batalha onde se realizou o embate entre
franceses e ingleses era um charco lamacento limitado pelos flancos por
bosques, adquirindo formato de funil, o que favoreceu os ingleses em detrimento
dos franceses. O imenso número de inimigos favoreceu a atuação dos arqueiros
ingleses, que disparavam nuvens de flechas sobre as hostes inimigas.
Calcula-se que poderia chegar a 70 000 flechas por minuto. O exército francês,
sem ter para onde fugir, foi dizimado. Henrique V ordenou que não fizessem
prisioneiros, temeroso que esses pudessem se reorganizar e mudar o destino da
batalha em prol do reino da França.
Na manhã do dia 26 de outubro,
Henrique V e seu exército passaram por cima dos cadáveres estendidos no campo de
batalha, indo em direção a Calais, onde chegou somente no dia 29. Retornou a
Londres em 11 de novembro, tendo sido recebido triunfantemente.
Com a vitória inconteste, Henrique V
conseguiu a legitimidade que tanto procurava, além do apoio do parlamento e da
nobreza. Outras investidas foram realizadas até que em 1420 os regentes da
França e Inglaterra assinaram o Tratado de Troyes, no qual tornava Henrique V
sucessor de Carlos VI, acumulando, dessa forma, as coroas de França e
Inglaterra. O destino do reino francês estava determinado, não fosse o
surgimento de outra figura emblemática e misteriosa: Joana d’Arc.
Referências:
CURRY, Anne. A Guerra dos Cem Anos. Barcelona: Osprey, 2010.
MONTEIRO, João Gouveia. Guerra e poder na Europa medieval.
Coimbra: Universidade de Coimbra, 2015.
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